sexta-feira, 18 de maio de 2007

UM POUCO DE HISTÓRIA

As pessoas são imediatistas, principalmente em nossa sociedade capitalista. Não tenho a pretensão como tantos que estão aí no "mercado" do terceiro setor de ganhar dinheiro. Tenho uma idéia que estou perseguindo há dez anos e que nunca esteve tão perto de se concretizar; por isso alguns dias a mais ou a menos não farão diferença. Estou falando da ANF-Agência de Notícias das Favelas. Algumas pessoas podem falar: quem vive de passado é museu. Porém ninguém vai a lugar algum se não souber quem é, de onde veio, onde está, e para onde quer ir. Por isso trouxe hoje a primeira matéria onde citei a idéia da ANF.
A MISÉRIA ENCAIXOTADA HÁ UMA DÉCADA
Moradores do Dona Marta, em plena Zona Sul, vivem em containeres improvisados desde 1988
Encaixotada, vivendo num container de zinco, onde a temperatura chega a 50 graus no verão, a servente Maria do Socorro Ferreira Soares, de 30 anos, cria os quatro filhos em seis metros quadrados. Há quase dez anos, ela cuida de suas eventuais queimaduras nas chapas quentes que fazem a vez de paredes e das pneumonias típicas de lugares insalubres. Ao todo, sete famílias vivem em condições subumanas no Morro Dona Marta, dentro de containeres, aguardando as casas populares prometidas pelo município aos moradores retirados de áreas de risco após os deslizamentos de terra provocados pelas chuvas em 1988. O aniversário de uma década de esquecimento será comemorado, este ano, em grande estilo: a Casa da Cidadania, que acaba de ser criada para dar assistência jurídica aos moradores da favela, vai mover uma ação na Justiça exigindo uma solução para o problema.
Idéia é criar outras instituições semelhantes na cidade

A falta de conhecimento da população pobre sobre seus direitos de cidadão inspirou a formação da Casa da Cidadania. A idéia é que, dentro em breve, cerca de dez instituições semelhantes passem a funcionar em morros do Rio. A empreitada não começa no Dona Marta por acaso. Durante três anos, entre 1993 e 96, André Fernandes, assessor do pastor Caio Fábio na Fábrica da Esperança, trocou uma vida confortável de classe média por um barraco no morro. E não deixou que a estada se limitasse a ser uma experiência politicamente correta. No morro, André tornou-se, fundamentalmente, um morador. Graças a seu conhecimento do lugar, sabe-se hoje que o Dona Marta pode ter uma população de até 12 mil habitantes. Número bem diferente das estatísticas oficiais que contam pouco mais de 4 mil.

Muitas dessas pessoas parecem conformadas com a própria sorte. Maria Beata Vítor, de 48 anos, é outra moradora dos containeres. Sob o teto de zinco, arrumou seu único cômodo, com cortina, espelhos e vaso de flor. Ela nunca procurou a Prefeitura para cobrar a casa de verdade que lhe fora prometida. Talvez pelo mesmo motivo que leva a servente Maria do Socorro a nunca reclamar da situação em que vive, apesar da miséria:

- Pior é que a gente ainda tem que dar graças a Deus por ter esse cantinho aqui. Já pensou se tivéssemos que morar embaixo de um viaduto, como tanta gente que sofre nesta cidade?Após o deslizamento ocorrido em 1988, Maria do Socorro foi incluída na lista das pessoas que moravam em áreas de risco no Dona Marta. Com o marido, ela foi orientada a deixar o barraco de sala e quarto e se instalar, provisoriamente, num container montado pela Prefeitura. O improviso não deveria durar mais de seis meses, mas está prestes a completar dez anos. No container, ventilado por duas janelas e alguns buracos de bala, Maria do Socorro acabou tendo os filhos. O mais velho tem 9 anos de idade.

- A maioria dos moradores aqui desconhece completamente os seus direitos. Isto se reflete na qualidade de vida que eles levam. Outro dia, em plena Zona Sul da cidade, fomos procurados pela mãe de uma criança totalmente desidratada com 1 ano e 3 meses que parecia um bebê de colo - conta André.

Além de assistência jurídica, a Casa da Cidadania também deverá promover atividades educativas e desenvolver uma agenda voltada para a prática de esportes. Outro projeto que será iniciado com a ajuda dos moradores será a criação de uma agência de notícias no Dona Marta que concentraria informações sobre todas as favelas do Rio.
Fonte: ROCHA, Carla. A miséria encaixotada há uma década. O Globo, 04/05/1997.

Um comentário:

Anita Deak disse...

Ótima matéria... Garanto que as famílias continuam lá morando nos conteiners, não? E ano q vem vão fazer 20 anos, puro descaso...Bjs, Ana Rita

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