quarta-feira, 3 de outubro de 2007

LANÇAMENTO DO LIVRO "A CONTRAPELO" DE MARCIANO LOPES

Hoje é lançamento do segundo livro de Marciano Lopes em Maringá. Em conversa com o autor ele me explicou o porque do titúlo "A CONTRAPELO" falando do filósofo Walter Benjamim. Nesse momento lembrei-me de nossa colaboradora, a psicanalista Eliane Martins, que é uma leitora ávida de Benjamim. Leiam aqui um texto de Eliane Martins sobre o livro de Marciano.


NA CORRENTEZA DO TEMPO a gente esbarra na poesia...

Negro impasse:
erguer ruínas
ou contorná-las
em abismo

Perplexo vivo à deriva
caçador de cacos
na correnteza do tempo.

Contrapelo é uma expressão benjaminiana que não escapa a um leitor avisado. O título do livro de Marciano remete ao ferrão quase poético de um autor instigante, que nos desperta em cada uma de suas linhas à inquietude com o mundo e a busca por uma verdade histórica digna de ser vivida. Busquei as pegadas históricas do nosso filósofo de Frankfurt nas letras de Marciano, já que recebi dele a confissão de uma paixão comum: Benjamim, o filósofo do coração.
Encontro na poesia, isso era um aviso, o negro impasse proposto por Benjamim frente a qualquer monumento, uma vez que a barbárie se presentifica, ainda que sob a forma de resistência, em diferentes contornos da vida. É preciso escovar a história a contrapelo, nos lembra Benjamim nas suas dez teses, identificando em cada rastro humano a presença ameaçadora do sangue derramado pela prática cotidiana da injustiça. O materialista histórico rema contra o óbvio estabelecido, revolvendo as camadas obscuras que se querem esquecidas, resgatando nos cacos que ficam à deriva a única possibilidade de transmissão de alguma verdade digna.Aquilo que é tratado como exceção, a dor humana em seus profundos labirintos, é a regra geral vivida a contrapelo, sobre a qual temos que nos basear na luta contra a injustiça. Manter viva a possibilidade do assombro, contra qualquer forma de desumanidade praticada dentro e fora de nossas fronteiras mais íntimas, remove nossas pequenas mediocridades estabelecidas.
Na correnteza do tempo, como Benjamim, lutamos poeticamente contra o mundo profano, cúmplice do conformismo.Enquanto escrevo este texto ouço na TV uma matéria sobre o Carandiru, uma das maiores barbáries já cometidas neste país, transformada em livro, filme e outros monumentos de cultura devidamente reconhecidos. A história manchada pelo sangue dos oprimidos, que deveria nos causar horror a qualquer tentativa de contorno, leva certamente ao abismo. Um jornalista - plenamente reconhecido como porta-voz dos opressores, que como nos alerta Benjamim, tem vencido esta guerra contra a vida - referenda a barbárie, sob a alegação de que as vítimas eram merecedoras da crueldade praticada maciçamente, em nome da ordem social estabelecida.

A perplexidade, nos ensina Benjamim, não nos paralisa. Ela vira trabalho político e a gente ainda cata os cacos, fazendo poesia. O texto de Marciano nos traz de volta à vida, na correnteza do tempo, dignamente reestabelecida.

Eliane Martins

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